quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Passo de dança.

E quando a dor já não mais me doía tanto assim, você teve a brilhante idéia de me aparecer com um sorriso de amanhecer. Eu ainda fechei os olhos e desejei acordar depressa, mas não era um sonho e o salão não era o meu quarto escuro, sem charme. Eu até falei que estava no caminho errado, mas minha voz virava música, eram notas musicais para todos os lados e você me chamou para dançar.

-Dá-me a honra de dançar contigo esta canção?
E éramos somente nós dois fazendo passos no salão e os meus pés quase não tocavam o chão, e eu via a minha dor que já não mais me doía tanto assim abrindo alas para a minha chegada e para a minha solidão, ia começar tudo outra vez. Over and over again.
Eram o silêncio profundo e a ternura eterna que iam me consumindo aos pouquinhos. Pedaço por pedaço de mim, pedacinho por pedacinho mal amado aqui dentro. Tudo consumido por um silêncio profundo, ternura e depois de umas notas musicais e uns passos a mais, consumido também de mágoas.
Aquela amargura que há tempos não queria nem sentir o cheiro, estava fervendo e borbulhando o meu sangue, a amargura que há tempos eu não queria nem sentir de qualquer maneira, estava fazendo de mim um pedaço usado. Eu era um ser inteiro em pedaços de aflição.
E foi para não me entregar de vez aos braços quentes do homem que por algum tempo foi para mim meu caminho proibido e de repente quase sem sentido abriu as portas, me jogou um tapete e me convidou para passar, que eu fugi de mim mesma e fui tentar encontrar a minha dor. Que me acompanhou por tanto tempo, me afastou da solidão escura e acabou por me lagar e me deixar semi-só no salão por acreditar que a música destrói qualquer dor. Mas a minha não, a minha era surda e não teria Bethoween ou Amadeus que a fizesse derreter e se misturar com as lágrimas já deitadas no chão prestes a afundar num vazio sem fim e ser também desfragmentada e transformada em uma gotinha pequena sem gosto, sem cheiro, sem cor e principalmente sem luz.
-Aonde você vai?
-Fugir de mim ou me encontrar, ainda não sei.
-Você sempre foge de si mesma quando se encontra em mim?
-Sempre.
Em instantes eu senti o chão que era frio a ponto de me subir pelo salto e gelar minhas pernas, derreter como flocos de neve dinamarquês no verão. O chão sumiu, o frio ficou...Ficou com medo. E eu fiquei com frio e com medo e com verão me corroendo o coração, me embrulhando o estômago e me atormentando o juízo. Eu o amava.
-Você não ia embora?
-Já fui, faz tempo.
-Não foi, te vejo.
-Não existo, não mais.
-Existe, é claro.
-Ainda me vê?
-E sinto.
E novamente éramos somente nós dois, sem saudades batendo à porta do salão, sem amor com medo da solidão. Só tinha amor procurando um lugar seguro para se esconder, além de mim, além dele, além de debaixo da mesa. Éramos nós dois nos mesclando com a ternura que se espalhava pelo ar, enquanto as estrelas faziam a festa no sistema solar, enquanto os pássaros posavam, mas não cansavam de voar, éramos nós, éramos nós, éramos apenas nós.
E ele me alterava em fração de segundo, coração ficava batendo a mil por minuto e quase nada de repente.
-Fique.
-Não.
E larguei o que me prendia ali mesmo. Corri pensando no que poderia acontecer se eu ficasse. E pensei tanto que quase não conseguia correr, meus pensamentos não cessavam e meu coração não queria mais ser o apogeu da minha dor – e que dor – enquanto eu conseguia fingir que estava sempre tudo muito bem. E se ele fosse embora para sempre como havia prometido? E se resolvesse ficar? E se não mais me amasse? E se fosse tudo uma grande e bonita mentira? E se não houvesse um final para que eu pudesse puxar minha poltrona, sentar e assistir? Eu não queria ver o final. Então corri, corri até perder o fôlego e quando quase não me restava oxigênio, eu voltei.
-Hey, espere. Estou aqui, de volta.
-Esbaforida. Para que tanta pressa?
-Para não lhe perder.
-Nunca, nem de vista.
-Eu te amo.
-Faz-me rir.
-Eu te amo.
-E se não der certo?
-Vai valer a pena da mesma maneira.
-Então façamos valer.
E depois de algum tempo, não tão simples como uma poema mal escrito, tudo isso não deu certo, mas valeu a pena.

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