segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Vênus + Vênus. Marte + Marte. S2


Deixa-me lhe assistir dormir, menino, deixa sem nem precisar mais pedir. Acompanhar seu sonho com o olhar e não perder de vista, mas perder as pontinhas de meus dedos em seus cabelos, e me perder em tiras no delírio do teu mesmo sonho para sempre dogmático, o sonho que nenhuma moça será capaz de despertar. Desperte-se. Quem se importa o que foi dito por aquele rapaz, ele também mentiu. Então se tem o livre arbítrio, use-o. E, menino, deixa-me te abraçar por qualquer tempo que seja. Um segundo, dois, eternamente sem cessar, e assim quem sabe adormecer a dor colossal que quase não me deixa respirar, e que à noite puxa meus cabelos com as pontas dos dedos. Como se estivesse desenrolando um carretel de lã, puxando sem nem ter medo de pocar. Tec.
Então deixa, menino, me deixa passar um minuto a mais com você. Tic tac...
Mais um, mais outro, outra volta no relógio que não pára nunca... Meia volta, quatro voltas, um minuto apenas, só um.
E por um minuto não ter vontade de deitar e sumir para dentro do colchão, nem me esconder em um buraco no chão e criar um túnel e reaparecer em uma cidade bonita e distante, onde ninguém saiba que a dor que eu carrego no peito é maior do que eu.
E até parece, é quase uma vã ilusão, mas por um minuto nem pensar em morrer e o tempo inteiro morrer, mas morrer de medo de lhe perder nem que seja um pedaço bem minúsculo do tamanho de uma célula. Um pedaço de você invisível a olho nu.
Menino, acorda.
O dia está nascendo mais bonito que nas demais madrugadas, o sol está ansioso para te ver, pois é a sua presença que entoa o canto da calada da noite e sem ela, as demais noites não virão.
Menino, meu menino, eu mal sei onde me esconder quando a solidão me encontra, então sempre invento de pegar papel e caneta e te escrever uma carta, dessas que a gente nunca manda, dessas que ninguém nunca lê, a menos que me olhe bem fundo nos olhos, mas você não tem tempo, pela milésima vez.
E eu te amo, nas noites caladas, no céu sem estrela, na madrugada sem fim, nas unhas ainda sujas de sangue, no rosto encharcado de dor, na dor encharcada de lágrima, na lágrima encharcada de amor.
Eu te amo no reboliço do coqueiro, na dança das palavras, na melodia do silêncio e na poesia que nem rima, na biografia que nem conta, na matemática que nem é exatamente correta, te amo nas ruas que só vão, não voltam.
Na grosseria, no perdão, no orgulho ferido e no orgulho que consome o tempo inteiro o medo, o medo, eu te amo no medo.
Eu te amo nas mangas, nas uvas, nas bebidas sem álcool e também nas com álcool, te amo nas mentiras e na raiva que sinto quando finjo estar tudo bem, ainda assim eu te amo.
Na luz que apaga, na estrela que acende, na porta que abre, na alegria cadente, eu te amo onde você quiser que eu te ame, e por favor, fique aqui.

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